sábado, 6 de abril de 2013

O Anjo da Tempestade (Nuno Júdice)

A história de um antepassado morto em circunstâncias misteriosas, tornada obsessão na mente de um homem que divaga. Um narrador que se perde entre imagens e especulações sobre esse acontecimento passado, fundindo-o com as suas próprias vivências para nele analisar as sombras do amor e da morte, associadas ainda à sua evolução ideológica e filosófica. Assim é O Anjo da Tempestade, romance em que acontecimentos e possibilidades se confundem e todas as personagens são o veículo de uma identidade comum.
Narrado na primeira pessoa e construído como uma longa divagação sobre os temas e as experiências que marcam a vida do protagonista, este livro tem o seu principal ponto forte no peculiar encadeamento de ideias. No centro, está o crime que vitimou o tio-bisavô do protagonista, sendo este acontecimento a base de uma longa especulação sobre o que lhe poderá ter acontecido e que história lhe estaria associada. Mas este conjunto de possibilidades é também um ponto de partida, abrindo caminho para divagações filosóficas, considerações sobre ideologias a que o narrador é mais ou menos fiel, consoante a passagem do tempo, e até a uma certa inclinação romântica, baseada tanto em experiências pessoais como em ligações atribuídas ao sempre presente antepassado. Todo este conjunto se constrói tendo o dito crime como centro, e ponto a que sempre regressa, mas numa dispersão progressiva, que se acentua à medida que diferentes personagens se confundem, definidas pelo que têm de semelhante.
Não é propriamente uma narrativa fácil de seguir. Para os acontecimentos centrais, múltiplas explicações são apresentadas, cada uma questionando a anterior e servindo de base a novas especulações. Além disso, a morte do tio-bisavô é um tema que se repete, pelo que, a partir de certo ponto, é inevitável uma certa impressão de dèjà vu, de uma repetição de ideias que, apesar das diferenças subtis, se torna um pouco cansativa.
Também não é um livro de leitura compulsiva, nem se esperaria que fosse, tendo em conta o tom de divagação e as muitas considerações mais ou menos filosóficas que o definem. Ainda assim, há pontos de interesse que sobressaem, desde a forma como certas ideologias influenciam os pontos de vista do narrador ao tom quase poético que transparece nos melhores momentos. A história perde-se, por vezes, num excesso de divagação, mas a fluidez das palavras permanece, mantendo o interesse mesmo nos momentos de maior dispersão.
Tendo em conta tudo isto, a impressão que fica é a de um livro que vive mais das ideias que propriamente de acontecimentos e que, por isso, se torna, por vezes, demasiado cansativo. Há, ainda assim, muito de interessante neste ciclo de ideias e memórias que se confundem. E isso, associado a uma escrita fluída e bela, é o suficiente para tornar a leitura interessante. Valeu a pena, portanto.

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