sábado, 12 de janeiro de 2013

O Último Dia de um Amor Eterno (Francisco Goldman)

Durante dois anos, Francisco e Aura viveram um amor quase perfeito. Apesar da diferença de idades, da oposição de alguns familiares e das suas diferenças de temperamento, conseguiram começar a construir uma vida juntos. Depois, um acidente na praia levou à morte de Aura. E Francisco teve de encontrar uma forma de lidar com a dor. Acusado pela família de Aura de ser o responsável pela sua morte e sentindo-se, ele próprio, culpado em certa medida, Francisco revisita as memórias que tem da sua jovem esposa para lidar com a sua perda. Este livro mostra a viagem através dessas memórias.
História de amor e de perda, e da capacidade de resistir e reagir depois dessa perda, este é, naturalmente, um livro muito pessoal. Assim, as emoções são o elemento determinante e o que marca até a mais simples das recordações do autor. Na história contada neste livro, Aura está em toda a parte, vista essencialmente pelos olhos de Francisco, mas também na percepção que tinha de si mesma, através da sua escrita. E este é um dos aspectos mais interessantes deste livro. O retrato que é criado para Aura não apresenta apenas a mulher, vista pelo marido, pelo que este vê da família, pelos traços que definem as suas acções. Mostra também a jovem escritora, com todas as esperanças e vulnerabilidades, com o coração cheio de sonhos e susceptível às frustrações. É fácil compreender essa Aura - a escritora e a mulher - e ver a percepção que o marido tinha dela é, por vezes, enternecedor.
A narração é construída ao ritmo da memória. Não há, assim, uma sequência linear de acontecimentos. Os momentos e as recordações parecem ser evocados à medida que surgem no pensamento do autor e, por isso, há fragmentos de episódios que são repetidos e pequenas coisas que levam a uma certa dispersão por diferentes memórias. Isto torna a leitura mais pausada, é certo, mas, por outro lado, parece a forma mais adequada de contar esta história. É fácil ver o sentimento de perda, não só no que é dito, mas na forma como é dito, evitando, por vezes, os momentos mais dolorosos, para serem contado apenas quando é preciso. E, assim, a dor da perda e o seu processo de relativa recuperação,  incluindo os momentos em que esta parece improvável, reflectem-se de igual forma nos momentos vividos e na organização de memórias que, com o evoluir da sua exposição, parecem revelar uma serenidade crescente.
Não é uma leitura fácil. Quer pela necessidade de seguir o autor através dos avanços e recuos de uma memória perturbada pela dor, quer ainda - e, talvez, principalmente - pela forma como a sua história reflecte pensamentos sobre a mortalidade e a capacidade de reagir à perda de quem nos é mais próximo, este é um livro que evoca questões difíceis e emoções poderosas. Há, ainda assim, algo que prevalece da tristeza com que esta história é narrada: a dor da perda está associada a um amor que se lê até nos mais simples gestos das memórias do autor. E também isso comove neste livro.

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