sexta-feira, 2 de novembro de 2012

A Última Duquesa (Daisy Goodwin)

Cora Cash é uma das mais ricas herdeiras da América e tudo o que a mãe quer para ela é um marido com um título sonante. É isso que as leva a partir para Inglaterra, onde há bastantes aristocratas arruinados dispostos a dar o seu nome em troca de uma fortuna que lhes permita recuperar o velho luxo. Há também diferenças colossais no que se considera socialmente aceitável e, inevitavelmente, a jovem herdeira sente-se deslocada no ambiente do velho mundo. Mas há um marido à sua espera e, ainda que acabem por se conhecer da forma menos convencional, o mais invulgar na sua união é que parece resultar de genuíno amor. Mas será esse amor verdadeiro tanto para Cora como para o duque de Wareham? E será garantia de felicidade num ambiente em que as convenções sociais servem de base a todo o tipo de intriga?
Ainda que a narrativa se defina essencialmente pela relação entre Cora Cash e Ivo, duque de Wareham, antes e depois de casamento, este livro não poderia estar mais longe do clássico enredo romântico. Não há grande ênfase na conquista ou no crescimento do amor entre os protagonistas, até porque o percurso até ao casamento acaba por ser relativamente breve, e a história centra-se antes no que vem depois. O romance é uma parte da história, é certo, mas uma parte relativamente discreta, sendo o papel das normas sociais nas intrigas e segredos de Ivo e nas mágoas pessoais de Cora o que realmente importa. E, tendo esses segredos e intrigas como parte dominante do enredo, todas as evoluções são possíveis, excepto o esperado final feliz da união sem barreiras.
Esta não é uma história de amor, pelo menos no sentido romântico do sentimento que tudo vence. A história de Cora é complexa e difícil, marcada tanto por erros e desilusões como pelo sonho com que parte para o seu casamento. Nada é a preto e branco. Para Cora, nenhuma das escolhas é fácil e virar costas à decisão é impossível. Mas é precisamente a complexidade da sua situação que a torna verdadeira cativante, mesmo quando é o pior do seu temperamento se revela na reacção aos que a rodeiam. 
O retrato social aqui apresentado é tudo menos harmonioso, revelando, muitas vezes, o pior das suas figuras principais. Há, portanto, várias personagens que inspiram essencialmente sentimentos negativos com os seus comportamentos revoltantes. Mas o que falta a estas personagens em empatia - e isto aplica-se ao próprio Ivo, com o seu secretismo e necessidade de seguir em tudo as convenções sociais - é compensado pelo seu contributo para o cenário global, quer pelo realismo do que representam (mesmo quando é a mesquinhez que sobressai), quer pela intensidade que dão ao papel de Cora no centro de tudo, ela sim uma personagem carismática, falível nos seus piores momentos, mas completa e profunda.
Importa ainda referir que a caracterização completa e detalhada não se aplica apenas ao carácter das personagens. Também os lugares, os eventos, os trajes e os objectos são descritos ao pormenor. Disto resulta que toda a narrativa tenha um ritmo relativamente pausado, mas também uma maior facilidade em imaginar o ambiente e a época em que decorre a acção. Além disso, esse ritmo mais lento não prejudica a envolvência, uma vez que esta caracterização torna mais nítido, e mais completo o retrato da sociedade apresentada, enfatizando também a relevância de questões como a diferença entre classes e as restrições do socialmente aceitável.
Cativante, com vários momentos intensos e um enredo bastante maior que o de uma simples história de amor, este é também um livro com muitos pormenores para assimilar e que, por isso, está longe de ser uma leitura compulsiva. Ainda assim, a história envolvente e o retrato detalhado das complexidades e tribulações da sociedade da época revelam também o muito de interessante que há para descobrir nesta leitura e tornam mais marcante o seu enredo. Trata-se, pois, de um livro com muito de bom para descobrir e que, por tudo isto, vale a pena ler.

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