segunda-feira, 1 de agosto de 2011

O Parente Mais Próximo (John Boyne)

Ano de 1936. O julgamento de um primeiro em terceiro grau do rei ocupa a atenção dos jornais, quando não é a própria reputação do rei a fazê-lo. E, enquanto o juiz Roderick Bentley se debate entre a consciência e a lei, Owen Montignac vê-se também numa situação delicada, já que as suas dívidas de jogo são consideráveis e a herança que constava receber foi, afinal, para a sua prima. É necessário, pois, encontrar uma forma de cobrir o valor da dívida, caso contrário, as consequências poderão ser fatais. Felizmente, os escrúpulos não fazem parte da vida de Montignac.
Há algo de impressionante na forma como, apesar dos muitos segredos das suas personagens (alguns dos quais só surgem em plenitude numa fase já muito avançada), o autor consegue criar, desde as primeiras páginas, uma história envolvente e quase de leitura compulsiva. A escrita é precisa e directa, caracterizando situações e cenários na medida em que estes se tornam importantes para o enredo. O mesmo acontece com as personagens, cuja história prévia é revelada de forma gradual, de forma a manter vivas a aura de mistério e a impressão de que tudo pode acontecer.
Do enredo, importa referir a forma como a sombra do passado influencia decisões futuras, bem como as muitas questões interessantes que são levantadas ao longo da narrativa - sem que, por isso, esta se disperse da sua linha central. A questão de Eduardo VIII e da sua relação com uma mulher "pouco recomendável" representa na perfeição o impacto da opinião pública - tal como o caso julgado por Bentley na fase inicial da narrativa. Os dilemas de consciência do juiz e, surpreendentemente, também do próprio Montignac, apelam à reflexão sobre o valor das acções e sobre o direito a opinar e a decidir sobre a vida dos outros. E, ainda que explorada de forma mais discreta, também a forma de Stella Montignac reflecte de forma intensa os efeitos de um amor que evolui para a obsessão.
Se há vários elementos a seguir ao longo da narrativa - e isto é particularmente bem conseguido na medida em que o autor percorre as posições de diferentes personagens - , também é um facto que o centro de tudo é Owen Montignac. Ambicioso, sem escrúpulos, preocupado apenas com a sua própria sobrevivência, seria de esperar de um protagonista assim uma certa indiferença. Mas o que, de facto, acontece é que, ainda que injustificáveis, as suas acções não são a totalidade da sua pessoa e os momentos de consciência e de culpa no passado de Montignac levam a que o impacto desta personagem no leitor oscile entre uma certa simpatia e uma quase repulsa.
Cativante desde as primeiras páginas, O Parente Mais Próximo representa com bastante precisão o que de pior reside na natureza humana - ou o mal que nela pode ser invocado quando as circunstâncias são desesperadas. Feito de culpas e de interesses, de enganos e de crimes sem redenção, um livro que surpreende tanto pelas reviravoltas da história como pela natureza das personagens que a constituem. Impressionante.

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