quinta-feira, 17 de fevereiro de 2011

A Madona (Natália Correia)

Paris, cenário de amor, de agitação e de decadência. É esse o destino escolhido por Branca, oriunda de uma aldeia obscura e em busca de uma vida diferente da que conhecera até então. E é ela o centro desta história. Ela, em ligação com as tribulações e os escândalos da família, mas principalmente no elo estabelecido com um homem que ama, mas não sabe se ama como deveria. Que deseja, mas que ao mesmo tempo a repugna na sua estranha forma de ser possessivo. E que, entre a proximidade e a separação, representa parte do mundo que ela conhece, das ilusões que pretende conhecer e das descobertas de uma realidade que, na glória e na decadência, é sempre diferente de todas as expectativas.
É na poderosa beleza da escrita que se encontra o grande ponto forte deste livro. Cenários apresentados com uma forma tão própria que parece quase inatingível, expressões de sentimentos, de pensamentos e de memórias que se tornam quase palpáveis, metáforas inesperadas que parecem soar quase demasiado próximas... Um intenso domínio da palavra, numa escrita quase poética, que, mais que em acontecimentos, se reflecte na evocação de imagens.
O que acaba, de certa forma, por levar ao que torna a leitura algo difícil e, por vezes, cansativa. De instante em instante, percorrendo situações que, nalguns momentos, roçam o surreal, é difícil distinguir exactamente uma linha narrativa. Passado, presente e futuro surgem numa mescla de momentos sem que haja uma orientação temporal precisa, como se surgissem de uma memória errática no pensamento da própria protagonista. E entre as divagações e os pensamentos, a sensação que fica é a de que, por vezes, a história acaba por se perder.
Marcado por alguns momentos intensos, uma fase final bastante perturbadora e, principalmente, uma escrita de tal forma poética que se torna, por vezes, difícil vislumbrar os acontecimentos simples por entre a complexidade das palavras, A Madona não poderá ser uma leitura fácil. Cativa, ainda assim, pela beleza das palavras e por alguns momentos que, como um vislumbre de outra vida, acabam por surgir... quase reais.

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